terça-feira, 23 de setembro de 2014

O ESTADO NOVO: ESTRUTURA DE PODER - RELAÇÕES DE CLASSE





Os vários autores que se dedicaram ao estudo do Estado Novo no Brasil, coincidem na ênfase ao caráter centralizado e monolítico do Estado brasileiro durante este período de sua histórica política, configurando-se as condições favoráveis a um alto grau de autonomia em suas relações com a sociedade.
A idéia central quanto ao significado deste conjunto de medidas como componente primordial de um esquema de poder caracterizado por um Estado forte, centralizado e apartidário, suficientemente distante das forças sociais em confronto para resgatar sua autonomia e mesmo neutralidade de ação.
A importância da reestruturação do aparelho estatal como fator de preservação de uma ampla margem de manobras e do poder de manipulação e conciliação do governo central.
Este esforço de centralização político-administrativa, pelo qual se mantém a autonomia do Estado, manifesta-se através da montagem de um complexo quadro jurídico-institucional que estabelece novos padrões de governo e cria os mecanismos necessários para dar viabilidade à interferência do Estado nos diversos setores da realidade social.

1. CENTRALIZAÇÃO DO PODER E PREDOMÍNIO DA ORDEM PÚBLICA

Em sua proclamação ao povo brasileiro, imediatamente após o golpe de Estado de 1937, o Presidente Getúlio Vargas referir-se-ia à necessidade de um governo forte, dotado de um alto grau de liberdade de ação, com forma de deter os efeitos dispersivos dos "particularismos de ordem local" e as "influências desagregadoras internas e externas" que ameaçavam a soberania nacional.
O corporativismo, uma nova forma de organização política em que, paralelamente à descentralização administrativa-funcional, através de expansão e aperfeiçoamento da burocracia estatal, mantém-se a unidade do poder central. O fortalecimento do poder do Estado agiria como poderoso instrumento de subordinação dos interesses restritos, regionais e locais, ao interesse maior da coletividade, representado pelo governo central.
Essa identificação do Estado autônomo com uma forma superior de Estado que liberta o governo central da interferência do poder privado, de classes, grupos ou facções, é portanto, típica de uma visão ideológica particular do Estado autoritário. 

2. CENTRALIZAÇÃO DO PODER E REESTRUTURAÇÃO DAS RELAÇÕES DE CLASSES

Um outro aspecto relacionado com o significado da centralização e fortalecimento do governo federal, no período do Estado Novo, das relações entre o aparelho estatal e as forças sociais que se afirmavam no quadro as transformações que a sociedade brasileira neste momento atravessava.
O Estado Novo representaria historicamente uma etapa no processo de incorporação à vida política das novas camadas sociais que acompanhavam o desenvolvimento e diferenciação da economia brasileira, determinando a inviabilidade do sistema tradicional de dominação que refletia o predomínio da oligarquia agroexportadora no conjunto da sociedade,

A BURGUESIA CAFEEIRA

Na república velha, a organização do Estado, através do federalismo, representava um instrumento de expressão dos interesses dos grupos dominantes ligados ao complexo agroexportador, sob a hegemonia da burguesia cafeeira. A rigidez da estrutura de poder que se consolida ao longo desse período, calcada na supremacia dos setores tradicionais, é apontada por vários autores como um dos traços característicos da Primeira República. Segundo Edgard Carone, a consolidação do regime republicano significou uma ampliação do domínio dos "coronéis" que, desde o Império, comandavam a política brasileira. Os interesses agrários predominam, não só no plano federal, como também no âmbito da política estadual. Quanto o Legislativo, aos níveis federal e estadual, observa o autor, acha-se controlado pelos porta-vozes dos interesses agrários.

Nesta mesma linha, Boris Fausto ressalta a influência crescente do núcleo agrário exportador que assume as rédeas do governo após os primeiros anos da República. Nestas condições, o sistema político, cuja ruptura se esboça a partir de 1930, se caracterizaria por uma extrema rigidez às "menores aberturas que permitissem ampliar as bases da representatividade".

A mudança gradual político e a diferenciação do aparelho estatal, no bojo de um processo de crescente centralização do poder, respondem a um conjunto de pressões desencadeada pelas transformações econômico-sociais que então se produziam.
O momento histórico que antecede à implantação do Estado Novo é marcado por uma crise política, a um tempo crise de hegemonia e crise ideológica, cujas origens estão na raiz da revolução de trinta, evoluindo ao longo dos dias da primeira fase do governo Vargas. Entre os principais indicadores da crise de hegemonia que se abre nos anos 30, os analistas do período apontam o acirramento das cisões regionais, rompendo a unidade da oligarquia agroexportadora em torno do sistema politico existente, além do agravamento das tensões entre representantes e representados dentro desta estrutura de poder marcada pelo predomínio do setor cafeeiro.
O acirramento da divisão regional significou, do ponto de vista político, uma pressão contra a hegemonia da burguesia cafeeira. É também neste momento que se intensificam os atritos entre o setor hegemônico da coalizão dominante e sua representação política, introduzindo mais um fator de enfraquecimento do regime politico.
Podemos verificar que existe um certo consenso quanto à caracterização das condições sob as quais emerge o Estado  Novo, em termos dos desdobramentos de uma situação de crise de hegemonia em que os diferentes setores da classe dominante são incapazes de controlar a máquina política, criando-se, assim, condições favorável à formação de um Estado forte,.
Esta conjuntura política particular introduz um teor de instabilidade política que age como novo fator de pressão no sentido de uma mudança de regime político: o fortalecimento do Executivo aparece como condição de preservação da ordem e, portanto, de sobrevivências dos grupos dominantes.
A influência política dos setores tradicionalmente dominantes, quer pela impossibilidade de que readquirissem o controle do sistema decisório, quer  pelo aprofundamento do processo de desestruturação do recurso de poder  que ainda manipulavam.
A centralização e o fortalecimento do Executivo durante o Estado Novo como o clímax do processo político marado por uma crise de poder, em que a incapacidade de qualquer dos grupos em confronto impor-se-a aos demais seria o traço dominante. Uma das formas de dar viabilidade a essa acomodação entre os setores dominantes dentro da estrutura de poder pode consistir no estabelecimento de um complexo jogo de influências, que sejam definidas distintas áreas às quais se garante acesso privilegiado aos grupos diretamente interessados, assegurando-se simultaneamente o fechamento do processo decisório em suas instâncias superiores.
O controle do poder central sobre o processo decisório deve ser entendido num sentido relativo, na medida em que a consolidação das tendências coercitivas e centralizadoras que, a partir da mudança de regime político, passa a ser a tônica do reaparelhamento estatal, implicaria na exclusão da influência, através dos quais a interferência dos diferentes grupos se faria sentir a partir de então.
Admitindo o papel ativo do Estado, é preciso simultaneamente tentar captar a identidade dos processos sociais, pelo menos em sua capacidade de gerar pressões que podem evoluir numa direção não contida nos parâmetros originalmente definidos pelo sistema político.
Ao Estado autoritário, que se  consolida entre 1937/1945, percebia como máquina centralizadora, monolítica, independente e equidistante das forças sociais em confronto, gostaríamos de contrapor uma visão  que enfatiza a heterogeneidade e complexidade do aparelho estatal, o  que nos leva a concebê-lo como um conjunto diferenciado e não monolítico de estruturas de decisão.
Qualificando a autonomia do Estado, poderíamos dizer que os vínculos com grupos externos, enquanto parte integrante da dinâmica da burocracia estatal, constituem para nós elementos centrais da análise da política brasileira no período considerado.
O Estado Novo não significaria uma ruptura em relação à experiência liberal da fase precedente, na medida em que a centralização político-administrativa, bem como os alicerces do corporativismo imposto às estruturas de articulação e representação de interesse já estavam contidos no regime híbrido implantado após a vitória da Revolução de trinta.
Não obstante, as mudanças postas em prática teriam uma direção, que seria representada pelo descenso político do grupo agroexportador a ascenção gradual e simultânea dos interesses urbano-industriais, que, a partir de então alcançariam maior visibilidade, consolidando e ampliando o espaço econômico já ocupado e conquistando um espaço político próprio.

4. O SIGNIFICADO DA REVOLUÇÃO DE 1940: CONSERVAÇÃO OU MUDANÇA? DIRETRIZES DO PRIMEIRO GOVERNO VARGAS


As diretrizes econômicas do primeiro governo Vargas teriam um caráter anti-modernizante, envolvendo objetivos nitidamente ortodoxos, tais como a austeridade financeira, a rigidez orçamentária, o controle dos créditos e a contenção do volume dos meios de pagamento, política que teria, entre seus efeitos básicos, dificultando a recuperação econômica do país e frear a industrialização.
O que é importante ressaltar, segundo o ponto de vista aqui adotado, é o peso excessivo atribuído pela maior parte das abordagens acima esboçadas às variáveis externas e à consequente minimização do papel que atores internos, incluindo aí a burguesia industrial
A interferência de uma elite ortodoxa, defasa em relação às mudanças em curso, teria determinado a incapacidade de o sistema reagir favoravelmente aos estímulos externos, freando artificialmente o desenvolvimento do setor moderno da economia.
A avaliação do processo revolucionário em termos de uma orientação e prática conservadora não nos parece pertinente. Com esta qualificação, aceitamos a caracterização do movimento de 1930 como um processo de "modernização conservadora".

OS ANOS TRINTA

Desta forma, podemos considerar os anos trinta como importante etapa na definição dos rumos do capitalismo industrial no país, observando-se, no plano econômico, o deslocamento do eixo da economia do pólo agroexportador para o pólo urbano-industrial e, no plano político, o esvaziamento da influência e do poder dos interesses ligados à preservação da preponderância do setor externo no conjunto da economia. O Estado Novo é um momento neste processo, representando a reafirmação das tendências autoritárias presentes desde o início, não só no ideário político, como também na atuação concreta de expressivos setores da liderança revolucionária.
As indústrias básicas, metalúrgica, mecânica, material elétrico e material de transporte, praticamento dobraram sua participação no total do valor adicionado na indústria, Foi também bastante significativo o crescimento das indústrias química e farmacêutica. Por outro lado, as indústrias tradicionais, apesar de ainda constituírem, em 1939, 60% do valor adicionado da indústria, tiveram a participação diminuída em relação a 1919, quando representava 72%.
A importância de distinção consiste em que um período de simples crescimento industrial, apesar da rápida expansão de algumas indústrias, não acarreta modificações estruturais profundas na economia, enquanto a industrialização, ao contrário, implica em modificações deste tipo, tornando-se a industria o setor líder do crescimento da economia.
Segundo o autor Eli Diniz, os anos trinta representariam efetivamente um corte, manifestando-se em vários níveis a ruptura com a ordem precedente. Em primeiro lugar, por um processo de reestruturação política voltada para a reafirmação do poder do Estado e para a nacionalização da política tendo em vista o esvaziamento do regionalismo e a desarticulação dos instrumentos do poder oligárquico.
O período se caracterizaria pela reestruturação das relações de classes e redefinição das alianças políticas. O novo pacto de poder, bem como a redefinição de suas bases sociais, inspirariam um novo estilo de política econômica caracterizado pelo aperfeiçoamento dos instrumentos e mecanismos de intervenção do Estado na economia, aspecto básico da transição para o capitalismo industrial.

5. OS ANOS TRINTA: DIFERENCIAÇÃO DE INTERESSES -  REDEFINIÇÃO DAS ALIANÇAS POLITICAS

O comportamento das elites tradicionais e emergentes durante a Primeira República fornece evidências para os dois tipos de argumentação.

Efetivamente, abrir espaço para o desempenho de sua atividade produtiva não exigiria transformações radicais. Assim, é sabido que um dos principais mecanismos utilizado para proteger os interesses da produção para o mercado externo foi  a desvalorização cambial que  favorecia também os grupos industriais.

6. BIBLIOGRAFIA


DINIZ, Eli - O Estado Novo: Estrutura de poder - relações de classe.

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